17.3.09

Cultura ilegal

Lembro-me de, em 2004, estar olhando o livro de uma enciclopédia que temos aqui em casa, da época que eu e minhas irmãs fazíamos pesquisas escolares por ela. Folheando as páginas, um boxe me chamou atenção – ele falava sobre uma nova extensão de arquivo, a qual compactava as músicas de maneira que o ouvido humano não percebesse a perda de qualidade e que ocupava muito menos espaço que o .wav, padrão de som nos computadores: o .mp3.

Na época não liguei muito para aquilo, talvez por eu não acessar muito a internet.

Mas o tempo passou. De repente, aquele termo aparecia em alguns sites, um ou outro gadget possuía a tal sigla e, quando me dei conta, um mp3 player era sonho de consumo de muitos.

Aos poucos aquilo foi se tornando cada vez mais cotidiano. O download ilegal de músicas tornou-se algo tão banal que aqueles que não o praticavam eram marginalizados. Mesmo os que podiam pagar pelos CDs de suas bandas preferidas não resistiram à impunidade virtual, criando uma revolução na maneira de escutar música.

Os ecléticos descobriram que havia muito mais estilos musicais do que pensavam; quem não gostava de nada acabou se apaixonando por alguma batida; e aqueles que só gostavam de funk, pop e axé denominaram-se “epiléticos” (desse site eles devem gostar).

Estava tudo indo muito bem até alguém lembrar do pessoal que tira seu sustento pela indústria fonográfica. Compositores, pessoal do áudio e até faxineiros das gravadoras começaram a ficar preocupados com tudo isso.

Amparados pela lei (com motivos de sobra), tais grupos obtiveram sucesso em muitos casos. O mais recente em âmbito nacional foi o fechamento da maior comunidade do Orkut destinada à troca de links para downloads: a Discografias, que contava com mais de 900 mil membros.

Nem vou dizer que isso foi só pra inglês ver, porque quem quer mesmo os arquivos ilegalmente vai procurar pelos outros infinitos meios que a internet oferece. Mas ainda assim é uma medida um tanto polêmica.

Todo mundo já percebeu que o sistema atual de venda de músicas é falho. MUITO falho. Mas, ao invés de criarem algo inovador e eficiente, as grandes gravadoras continuam insistindo no que, na era pré-banda larga, funcionava.

Claro que temos nossa parcela de culpa, mas não somos os únicos. Inúmeras pessoas e empresas lucraram com tudo isso, inclusive gigantes do mercado.

Primeiro, o mais óbvio de todos: fabricantes de mp3 players e celulares. Um dos motivos para a popularização do formato .mp3 é a praticidade que tais aparelhos oferecem – apenas alguns cliques são suficientes para depositar centenas de músicas. E o aumento exponencial na capacidade de armazenagem agrava ainda mais o problema, uma vez que não adianta de nada ter 60gb disponíveis no iPod e manter uma lista com meia dúzia de canções. Não vejo nenhuma dessas empresas pedir desculpas, ou qualquer coisa que demonstre o mínimo de responsabilidade por tudo isso (a não ser a Apple, que criou um sistema de vendas online, mas que ainda assim retira seu lucro).

Alguns dos outros inúmeros ramos beneficiados com tais meios ilícitos de entretenimento são o de venda de CDs virgens, fones de ouvido, DJs, até mesmo sites como o Last.fm.

Acho que na briga pelo uso de tais arquivos não se deve considerar apenas o lado dos profissionais fonográficos. Essa prática possibilita uma distribuição mais justa da arte. Proibir e punir todos que os seus adeptos poderia entrar na questão do elitismo cultural, privando os menos afortunados – como vem acontecendo há anos em nossa sociedade.

E, como é na crise que as soluções aparecem, creio que estamos diante de uma mudança na maneira de avaliarmos a música. Seu valor monetário com certeza caiu, enquanto o valor “artístico” tende a aumentar. Em breve soluções criativas devem começar a surgir, e aquela que beneficiar ambas as partes, consumidores e produtores, prevalecerá. Até lá, basta esperar, especular e, claro, protestar, da forma que cada um pense que é a melhor – inclusive baixando ainda mais músicas.

3 comentários:

Anônimo disse...

Você falou que a indústria fonográfica continua tentando sobreviver da mesma maneira da era pré-banda larga como se isso fosse algo MUITO ruim, fala de "reinventar" o modo de distribuição de conteúdo, mas o que sugere. Posso ter entendido errado, mas parece que você quer dizer que vender aqueles cds com caixinhas e blábláblá é tãããoooo last week, e que a boa seria, por exemplo, fazer como a Apple: vender músicas online, sei lá. Beeem, "cds em caixinhas" pode até ser considerado obsoleto, mas acho válido, oras. E, antes que me perguntem (ou não), não, eu não compro cds. Por que? Porque são megaaa caros, uai. Só compro cds de bandas/cantores(as) que gosto MUITO, mais pra ter de "recordação" do que de fato para ouvir, porque tenho celular e computador para fazer isso (hoje em dia nem pra escutar música no carro você precisa de um cd, é só plugar seu mp3 player, rs) [perdi o fio da meada]

Tuiki disse...

mas realmente a indústria da fonográfia é abusiva sim, o custo TOTAL dde fabricação de um CD de músicas é de 5 reais. cobrando 15 ou 20 reais por cada cd, seria muito mais acessível, do que 30 ou 40, afinal o povo brasileiro, não possui tal poder consumidor, não no geral e realmente, é um preço abusivo por um cd.

Lara Mendonça disse...

Olha, eu já pensei infinitamente sobre esse assunto, honestly.

Acho que a grande revolução da indústria não foi o mp3. Ela não se reinventou. Nós a forçamos a dizer 'ah, tá, então. não tem jeito...'

A única coisa capaz de mudar uma indústria é a revolução vir de dentro. Como por exemplo com o que a MTV trouxe. Gostem ou não, o conceito de uma tevê sobre música, livre de politicagem, é uma coisa revolucionária.

Então, o que realmente vem mudando a mente das pessoas é a abertura que os próprios artistas (e algumas sábias gravadoras, como a brasileira Trama Virtual e algumas gringas) tem dado nesse sentido.

Eu, por exemplo, me sentid nas nuvens quando pude baixar de graça uma versão (completa, HQ) de uma música nova do Cansei de Ser Sexy, assim que eles liberaram no site oficial.

Com o Coldplay foi a mesma coisa.

E as vendas deles caíram? Pelo contrário. Esse CD do Coldplay vendeu mais do que os outros 3 juntos (e eu sei, tenho toda a discografia em CD mesmo).

A melhor maneira é atrair de outras formas... De um jeito inovador, as pessoas ainda vão preferir comprar o CD, se gostarem da banda. E ai que entra: finalmente só os bons artistas (não aqueles que você até baixa, mas não tem interesse no CD) vão ser vendáveis, e isso servirá como um filtro pra indústria.

Mas os fãs sempre serão fiéis, porque senão, como Calypso estaria em Angola e o RBD faria 3487438 shows de despedida (todos esgotados)?

Como o Arctic Monkeys pregava (quando dava CDS nos shows, antigamente): como uma banda sem moral nenhuma, que acabou de estrear, quer cobrar pra ter sua música divulgada?

Escrevi demais, mas é isso. Amei seu post, já falei pra você que me surpreendi em como você escreve bem e seu blog só tem melhorado isso.

BEIJO COMUNIDADE